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Obesidade

Cirurgia bariátrica: como manejar a hipoglicemia pós-prandial?

bariátrica
Escrito por Luciano Albuquerque

A cirurgia bariátrica é atualmente o tratamento mais eficaz para obesidade grave em termos de perda de peso e melhora das comorbidades relacionadas. Apesar de segura, o procedimento não é isento de complicações. A hipoglicemia pós-prandial está entre as complicações tardias, após mais de 6 meses do procedimento, ocorrendo 1 a 3 horas após uma refeição, com sintomas adrenérgicos e neuroglicopênicos que melhoram após ingestão de glicose. A hipoglicemia é consequência da passagem rápida dos nutrientes, particularmente os carboidratos simples, levando a variações rápidas na glicemia e a uma resposta incretínica exagerada, relacionada a níveis mais elevados do GLP1 e insulina.

O quadro tem gravidade variável, podendo ser incapacitante para alguns pacientes, com neuroglicopenia (cognição alterada, convulsões e perda de consciência) levando a quedas, acidentes e limitações laborais. Além disso, episódios repetidos de hipoglicemia podem resultar em progressiva redução dos sintomas adrenérgicos, com falta de percepção da hipoglicemia por parte dos pacientes, prejudicando ainda mais a segurança e exigindo a ajuda de outras pessoas para corrigir os eventos. Diante desse cenário, é fundamental o conhecimento acerca das medidas para prevenção e tratamento da hipoglicemia pós-prandial.

O ajuste da dieta é o principal ponto no tratamento da hipoglicemia pós-prandial. Embora não existam estudos randomizados comparando o impacto no longo prazo de diferentes planos alimentares, o controle do consumo de carboidratos, restringindo a um consumo máximo de 30 g desse macronutriente por refeição, é recomendado. O tipo de carboidrato escolhido é outro fator importante, sendo preferido o consumo daqueles com baixo índice glicêmico. A adição de fibras é recomendada. O consumo de gorduras (preferencialmente poliinsaturadas) pode atrasar o esvaziamento gástrico. Proteínas reduzem a absorção de carboidratos e aumentas a saciedade.

Na hipoglicemia, o tratamento requer ingestão rápida de carboidratos. Entretanto o consumo de carboidratos simples pode levar a hipoglicemia de rebote, sendo recomendado o consumo de carboidratos complexos ou a associação com gordura ou proteína na correção. Em casos de hipoglicemia grave, com sintomas neuroglicopênicos, recomenda-se o uso de glucagon subcutâneo.

Se as medidas nutricionais não forem suficientes, o tratamento medicamentoso deve ser iniciado. Os agentes disponíveis agem em diferentes mecanismos envolvidos na fisiopatologia da hipoglicemia. Acarbose e Canagliflozina atuam na absorção intestinal de carboidratos. Análogos de somatostatina, diazóxido e bloqueadores de canais de cálcio levam a redução da secreção de insulina. Avexitida é um derivado do exendin que atua como antagonista do GLP1, reduzindo secreção de insulina e aumentando a liberação de glucagon. O agente já mostrou eficácia em estudos de fase 2. A própria Liraglutida pode ter benefícios, por retardar o esvaziamento gástrico, além de reduzir secreção de insulina e aumentar a de glucagon durante o evento hipoglicêmico.

Em casos refratários, na presença de sintomas frequentes, intervenções cirúrgicas podem ser consideradas. A colocação de um tubo de gastrostomia no estômago excluso, com passagem alimentar pelo duodeno “bypassado” pode restaurar a resposta incretínica e reduzir os episódios de hipoglicemia. A colocação de um anel ou banda ajustável para atrasar o esvaziamento também já foi testada com resultados parciais. A reversão do procedimento cirurgico pode ser considerada nos casos onde as medidas anteriores seguirem falhando.

Concluindo, a relevância clínica da hipoglicemia pós-prandial nos pacientes submetidos a cirurgia bariátrica é inegável. As consequencias a longo prazo desses eventos, principalmente nos índividuos que evoluem com perda dos sintomas adrenérgicos e com maior variabilidade glicêmica, ainda são desconhecidas. Estudos adicionais são necessários para identificar e testar novas abordagens para prevenir e tratar a hipoglicemia grave. A compreensão dos mecanismos envolvidos na hipoglicemia pós-prandial pode fornecer informações importantes sobre a regulação intestinal do metabolismo da glicose com possíveis benefícios no tratamento da obesidade e do diabetes, entidades com elevada morbimortalidade no cenário atual.



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Sobre o autor

Luciano Albuquerque

Preceptor da residência em Endocrinologia do HC-UFPE e da residência em Clínica Média do Hospital Otávio de Freitas. Presidente da SBEM regional Pernambuco no biênio 2019-2020.

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