A desordem do desejo sexual hipoativo (DDSH) em mulheres na pós-menopausa com terapia hormonal da menopausa já otimizada mas que mantém as queixas de disfunção sexual é a única indicação formal de reposição de testosterona no gênero feminino, de acordo com diferentes diretrizes, incluindo o posicionamento da SBEM de 2019. Mas, na prática, a maior dúvida que recai sobre nós diante de uma paciente com indicação é: como fazer esta reposição?
Com o objetivo de guiar melhor os médicos especialistas na hora de prescrever testosterona nestes casos, a The North American Menopause Society (NAMS) publicou, este ano, um documento sobre o tema. A seguir, as principais recomendações das autoras:
1. Qual testosterona usar?
A única formulação de testosterona indicada para tratamento da DDSH é a formulação transdérmica por ser a via mais fisiológica. As apresentações intramusculates e os implantes subcutâneos devem ser evitados por levar a níveis séricos suprafisiológicos. As preparações orais são contraindicadas pelo risco de hepatotoxicidade.
2. Qual dose usar?
Deve-se usar 10% da dose usual masculina de testosterona transdérmica, o que corresponde a 5mg/dia. Para isto, devemos prescrever testosterona em gel a 1% (o que corresponde a 10mg/ml) e orientar o uso de 0,5ml do gel ao dia. Infelizmente, a Austrália é o único país do mundo que possui esta apresentação comercial. Nos demais países, resta como única opção a manipulação.
Outra opção seria usar 10% da dose de uma preparação transdérmica masculina disponível. Esta prática, no entanto, é mais complicada e pode gerar mais erros na hora da aplicação, com risco de doses suprafisiológicas.
3. Em que parte do corpo utilizar?
As autoras recomendam que a testosterona em gel seja aplicada nas panturrilhas, na parte superior externa da coxa ou nos glúteos. Deve-se sempre orientar as pacientes a evitar a transferência para a pele de crianças, companheiras femininas ou animais de estimação. O risco de exposição para um companheiro masculino é mínimo.
4. Como avaliar a resposta?
A avaliação da resposta é clínica e inclui aumento do desejo sexual e redução do sofrimento causado pela disfunção sexual. A resposta costuma acontecer após 6 a 8 semanas de tratamento, com efeito máximo em torno de 12 semanas. Se, em 6 meses, não houver resposta, a terapia deve ser descontinuada.
5. Como monitorar o tratamento?
Embora a dosagem de testosterona total não seja necessária para o diagnóstico, ela deve ser dosada quando houver indicação de reposição. O objetivo é ter os níveis basais para acompanhamento. Após início da terapia, realizar nova dosagem com 3 a 6 semanas.
Os níveis de testosterona total não devem exceder o limite superior da normalidade para o método. Se em níveis suprafisiológicos, deve-se reduzir a dose de reposição. Após atingir estabilidade dos níveis séricos, a monitorização da testosterona total pode ocorrer a cada 4 a 6 meses.
Não há indicação de dosar ou calcular a testosterona livre, mas as autoras recomendam a dosagem inicial de SHBG, pois mulheres com níveis acima do normal desta globulina tendem a ter menor chance de resposta ao tratamento. A elevação da SHBG, no entanto, não é motivo para fazer doses maiores de testosterona.
Sinais clínicos de hiperandrogenismo, como acne e hirsutismo, também devem ser monitorados. Se presentes, deve-se reduzir a dose da testosterona em gel.
A função hepática e o perfil lipídico também devem ser avaliados no basal e durante o seguimento.
6. Qual o tempo de tratamento?
Caso não ocorra resposta com 6 meses de tratamento, a testosterona em gel deve ser suspensa por ineficácia. Se, por outro lado, houver resposta, ela deve ser mantida, mas devemos considerar drug holiday após 12 meses de tratamento, para reavaliar a função sexual e a necessidade de continuar a reposição. Em caso de piora, reiniciar e manter o seguimento adequado.
Importante salientar que é preciso sempre esclarecer a paciente que não há estudos de segurança com a reposição da testosterona para tratamento da DDSH. Por isso, enquanto novas evidências não surgirem, a reposição de testosterona em gel deve se limitar a casos específicos e bem selecionados, atentando-se para a monitorização e o seguimento adequados.