A tireoidectomia total é o procedimento cirúrgico classicamente indicado para o tratamento do carcinoma diferenciado de tireoide. Dentre as vantagens dessa abordagem destacam-se o fato de permitir negativação da tireoglobulina, facilitando o acompanhamento desses pacientes, além de garantir a remoção de todos os focos tumorais. Um outro argumento importante a favor da tireoidectomia total é que, com a ressecção completa do tecido tireoidiano, a ablação com radioiodo pode ser usada para detecção pós-operatória de doença residual ou metastática, bem como para tratamento. Por outro lado, a lobectomia tem como vantagens o menor risco de complicações cirúrgicas e a menor incidência de hipotireoidismo pós-cirúrgico.
O guideline da American Thyroid Association recomenda que a tireoidectomia total deve sempre ser realizada na presença de um ou mais dos seguintes fatores: tumores maiores do que 4,0 cm, extensão extratireoidiana grosseira, metástases linfonodais clinicamente aparentes ou presença de metástase à distância. A lobectomia pode ser considerada suficiente em tumores de baixo risco, com 1,0 a 4,0 cm, sem extensão extratireoidiana, sem acometimento linfonodal e sem metástases à distância. O documento destaca ainda que a lobectomia pode ser indicada para tumores menores de 1,0 cm, unifocais, sem extensão extratireoidiana e sem acometimento linfonodal.
No entanto, dados recentes mostram que tais recomendações podem mudar em um futuro próximo. Um estudo publicado no Jama Surgery no mês de novembro buscou avaliar se a lobectomia está associada a um resultado significativamente pior em comparação com a tireoidectomia total em pacientes com carcinoma papilífero de tireoide de risco intermediário e metástase linfonodal.
Para o estudo, pacientes com carcinoma papilífero de tireoide de risco intermediário que fizeram lobectomia ou tireoidectomia total, foram pareados 1:1. Foram incluídos pacientes adultos (com idades entre 18 e 75 anos) com carcinoma unilateral e metástase cervical lateral clínica ipsilateral (cN1b). Os pacientes com as seguintes características foram excluídos: tamanho do tumor primário maior que 4 cm, extensão extratireoidiana macroscópica, tamanho do linfonodo metastático maior que 3 cm e metástase à distância.
Após um período de seguimento médio de 60 meses no grupo da lobectomia e 58 meses no grupo da tireoidectomia total, recorrências estruturais ocorreram em 7,9% (21) e 6,4% (17) dos pacientes, respectivamente, sem diferença significativa. O desfecho primário, taxa de sobrevida livre de recorrência em 5 anos, também não foi significativamente diferente entre os grupos de lobectomia (92,3%) e tireoidectomia total (93,7%) (razão de risco ajustada, 1,10; p = 0,77). Os autores destacaram que “dada a menor taxa de complicações da lobectomia, uma diferença máxima de sobrevida livre de recorrência de 4,9% é aceitável, o que aumenta a confiabilidade dos resultados do estudo”.
Recentemente, tivemos um novo consenso sobre carcinoma papilífero publicado pelo Departamento de Tireoide da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, já discutido neste site. O documento destaca que evidências sólidas mostraram que a simples observação do lobo contralateral é segura em pacientes com doença de baixo risco após lobectomia. E, de acordo com o novo estudo apresentado, tal conduta poderia ser uma possibilidade também para alguns casos de doença de risco intermediário. Aguardemos novas evidências…
Referências:
Xu S, Huang H, Huang Y, et al. Comparison of Lobectomy vs Total Thyroidectomy for Intermediate-Risk Papillary Thyroid Carcinoma With Lymph Node Metastasis. JAMA Surg. Published online November 30, 2022.
2015 American Thyroid Association Management Guidelines for Adult Patients with Thyroid Nodules and Differentiated Thyroid Cancer